Maria Antônia é autista e tem altas habilidades. Para muitas pessoas o fato dela falar muito bem e camuflar os desconfortos das interações sociais é motivo para acreditar que ela consegue fazer tudo que todo mundo faz. Confesso que eu tive e às vezes ainda tenho dificuldades com isso também e por isso eu não paro de estudar e me informar sobre o tema.
A uns dias atrás fui surpreendida com uma “reunião” com a coordenadora geral da escola da Maria. Ela tentou me mostrar que Maria está acompanhando muito bem a sala e que não precisa de recursos pedagógicos para ajudar no processo de aprendizagem.
Fui pega com uma conversa extremamente desconfortável onde ela tentava me convencer da inteligência da minha filha. Colocou Maria pra escrever umas palavras com uns brinquedos pedagógicos e no final falou: “Viu? Ela é muito inteligente!”. Eu argumentei, falei que Maria estava em investigação para TDAH também, mas a informação foi completamente ignorada.
Em certo momento ela começou a falar que nós como mães não tínhamos capacidade racional de lidar com as questões escolares dos filhos porque estamos envolvidas emocionalmente com eles. E que costumamos simplificar para “ajudar”. E eu tive que refutar e falar que não sou permissiva, que exponho Maria a pequenas frustrações sim, pois eram habilidades pra vida, mas que eu também aprendi a lidar com os limites dela.
A conversa foi o tempo todo assim… ela falava e eu precisava me explicar.
Em dado momento ela disse que as crianças precisam aprender a esperar, que TODAS as crianças precisam aprender. E que a Maria também precisava e que estar ociosa na sala fazia parte desses momentos. Eu concordei, porém disse que esperar para uma criança autista não era algo simples, que custava bastante. E que muitas vezes as consequências só apareciam na minha casa. Que ela chegava nervosa, irritada e com limite para frustração 0. Falei sobre a máscara social e como as meninas autistas camuflam suas inquietações. Ela disse que nunca tinha ouvido sobre isso. E eu continuei dizendo que a percepção de tempo da Maria era diferente dos outros. Um minuto para quem pensa demais é muito tempo!
Em outra parte da conversa ela falou que como parte do aprendizado de esperar, que esperar a hora de ir ao banheiro era necessário. E eu tive que detalhar o problema que Maria teve com o banheiro da escola e disse que ela nem sempre sabe identificar a hora que quer ir ao banheiro e que pode acontecer dela pedir muitas vezes ou não pedir para ir ao banheiro. E que ela tem dificuldades reais com solicitações e pedidos. E aí aconteceu a parte mais irritante dessa conversa.
Ela falou que se fosse ela que colocaria Maria o mais longe possível da auxiliar e a colocaria perto da professora para que ela aprendesse a pedir e perdesse a vergonha. Pelo amor de Deus gente!!! Eu tive que explicar que a professora não tem condições de prestar atenção nas necessidades da minha filha e no resto da sala e que as necessidades da minha filha só eram vistas por causa da professora auxiliar. Que não tem lógica tirar a criança com dificuldade de socialização de perto de quem promove a socialização.
A conversa foi toda sofrível e carregada de capacitismo. O resumo dessa experiência foi: “sua filha tem um laudo, mas eu não acho que tá certo”. Ou poderia ser “Sua filha é “ótima” e não demonstra dificuldades, ela nem é tão autista assim!”.
Quando a gente fala que o problema da educação inclusiva está na base, é disso que estamos falando! Não é aceitável que uma coordenadora geral tenha esse discurso. Ela devia ter saído da faculdade sabendo e entendendo sobre diversidade e direitos da inclusão. E se a faculdade não proporcionou isso a ela, que a escola proporcione. Não podemos nos calar diante de comportamentos que lesam os direitos dos nossos filhos.
Eu levei essa situação para a diretoria da escola, que foi acolhedora e disse estar ciente que a auxiliar era direito da Maria e que isso não seria tirado dela. Maria segue acompanhando bem a turma e não foi feito PEI, foram feitas algumas mudanças simples para melhor compreensão dela, mas as mudanças foram para todos os alunos.
Por hora, estou satisfeita com o resultado, mas estou de olho! Não vou afrouxar na busca pelos direitos da minha filha. Pode até ter quem pense que ela não é tão autista assim, mas vai ter que aceitar!
Quando eu e outras mães nos posicionamos a respeito desses tratamentos que temos na escola, parece que nós estamos contra ela. Mas não estamos! Nós queremos parcerias. Porque temos que deixar nossos filhos na responsabilidade de terceiros todos os dias. Saber que estão sendo respeitados em suas individualidades é o que queremos. Não é absurdo! Não deveria ser uma utopia.
Aprender sobre a diversidade não é uma escolha! Os centros de ensino já deveriam se movimentar na criação de matérias ou até períodos sobre inclusão. Isso é urgente e extremamente necessário!
Nós precisamos falar mais sobre isso! Todas nós!
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Um abraço
Simone Rocha